quarta-feira, 19 de março de 2008

O Tigre e o Dragão (Parte 1)

Neste comentário sobre o filme "O Tigre e o Dragão", vou abster-me de contar a história, vou deter-me apenas sobre os personagens e suas relações.

A narrativa da história possui uma característica de Wushia, que poderiam ser interpretadas como "novelas chinesas", ou narrativas "cavalheirescas" dos antigos lutadores, exaltando sua virtudes. Então, ao interpretar a história, devemos levar em conta estas características.

O primeiro ponto que considero relevante se refere ao fato de que a trama se desenvolve em torno de quatro personagens, divididos em dois casais.
Segundo o "Dicionáro de Símbolos" de J. Chevalier e A. Gheerbrant, "desde as épocas vizinhas da pré-história, o 4 foi utilizado para significar o sólido, o tangível, o sensível. Sua relação com a cruz fazia dele um símbolo comparável de plenitude, de universalidade, um símbolo totalizador."

Das relações de casal e sua diferenças, tratarei ao final do artigo.
Primeiramente, tratarei das carcterísticas principais destas 4 personagens.

Li Mu Bai é discípulo de um mestre do templo Wudam, famoso por suas técnicas de espada. Seu mestre havia sido morto por Jade Fox, sua esposa, que desejava aprender, mas o conhecimento lhe fora negado; ela então, envenena seu esposo e lhe rouba suas "anotações".
Como em toda a Wushia, Li Mu Bai deverá vingar seu antigo mestre, mas depara-se com um conflito, está envelhecendo e deseja deixar a espada e viver em paz, ao lado da mulher que ama, mas, ao mesmo tempo, não possui descendentes em sua arte e este desejo lhe faz incorrer em erro.

Jen è uma personagem interessante: culta, filha de um governador, prometida em um casamento político, deseja ser livre, viver a vida dos lutadores, mas sem compromissos ou barreiras. Tem como governanta Jade Fox, que após matar o esposo se refugia na casa do governador. Juntas, procuram decifrar as "anotações" do antigo mestre, mas há uma diferença forte que afasta as duas mulheres.
A escrita "chinesa" é composta de símbolos e pode conter determinada sutileza em seus traços caso seja da capacidade de seu autor, assim como também da capacidade de seu leitor; assim, o que acontece entre "mestra" (Jade Fox) e discípula (Jen) é que a segunda consegue "ler" detalhes incutidos nos antigos alfarrábios que sua mestra nem sequer sonha.
Este pequeno detalhe causa-lhe uma empáfia ou orgulho que será o agente "detonador" de todas as situações "problema" na narrativa. Possui um treinamento, mas está incompleto, não aprende por uma relação, o que lhe gera desconfiança e descontrole, ao mesmo tempo em que possui um conhecimento parcial e tem nas mãos uma arma poderosa, o que a deixa invencível perante outros.

Sobre a espada, já havia comentado sobre a notoriedade da escola Wudam sobre esta técnica. cabe destacar que os chineses atribuem um "alma" própria às armas, sendo vedado o toque à sua lâmina, justamente para não "macular" tal "espírito".

A personagem Yu Shu Lien considero a mais difícil de ser comentada porque encarna um ideal dos praticantes de artes marciais: equilibrada, procura resolver as questões de forma diplomática sem mexer nas estruturas políticas e nos interesses individuais.
Neste sentido, uma das cenas chama a atenção; por ser uma personagem tão comprometida com determinados ideais, isto acaba gerando uma oposição natural com Jen, que é demonstrada pela cena que postei aqui.
Existem várias oposições entre as duas personagens, mas a gota d'água parece ser a insistência de Jen em interpretar as situações como "armadilhas" onde outros desejam comprometê-la.
A superioridade técnica de Yu Shu Lien é evidente no combate, ele inicia-se com uma batida de dao (facão), o que é uma marca típica de uma "lição" que um mestre dá a um aluno.
Devo lembrar que este combate é mais um capítulo de nossa Wushia, pois combates de armas não devem ultrapassar 15 segundos.
"Acerta-se a mão do oponente e o combate termina", explicou-me um amigo, professor do estilo Shaolim do Norte, em contato com seu mestre.
Mas o filme pretende fazer uma demonstração de armas e técnicas e, como coloquei anteriormente, deixar bem marcada a superioridade técnica de Yu Shu Lien sobre sua oponente, pois maneja várias armas: dao, futao changao, cheung, dui quan, Jor Yow Gim (respectivamente: facão, facão duplo, garra de tigre, lança, pequeno bastão e espada longa), Jen consegue uma aparente vitória atravéz de um "rompimento de regras", quando Yu Shu Lien já havia demonstrado sua vitória. Mais uma vez, neste momento, Jen demonstra o comportamento que lhe é característico na história; o rompimento de acordos ou a fuga quando é confrontada.

Lo é um habitante do deserto: órfão, bom vivant, ladrão, não consegue expressar-se adequadamente quando o assunto trata de sentimentos (pois o mesmo vive a aridez do deserto!); então, "seduz" seu objeto de desejo roubando-lhe um pente (!), Jen, também infantil sentimentalmente o persegue durante um dia inteiro: "devolva-me o meu pente"(!). Depois de muitos socos, chutes, fugas e facadas, finalmente o jovem casal consuma sua união.Lo deixa que seu objeto de desejo vá embora, a fim de contrair as núpcias as quais era comprometida, para depois, no dia do casamento, arrepender-se (?) e, de forma dramática, pública e impotente clamar pelo retorno de seu amor.

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